O carioca já está no oitavo verão desde que ouviu pela primeira vez a promessa de que 100% dos ônibus da cidade teriam ar-condicionado. A meta surgiu no Planejamento Estratégico 2013/2016, apresentado pela prefeitura do Rio de Janeiro em abril de 2012. Se o atual prazo para atingir o objetivo for cumprido, o verão 2019/2020 será o último. É que o município e as empresas de ônibus têm até 30 de setembro para garantir que toda a frota da cidade tenha ar condicionado.
Com pouco mais de oito meses pela frente, as empresas de ônibus da capital ainda precisam substituir cerca de um quarto de sua frota. A Secretaria Municipal de Transportes contabiliza que 75% dos ônibus da cidade estão climatizados, sendo 614 ônibus executivos (frescões) e 4.008 ônibus comuns com ar-condicionado.
O Sindicato das Empresas de Ônibus do Rio de Janeiro afirma que já conta com 80% da frota climatizada. O Rio Ônibus acrescenta, em nota, que o reajuste anual da tarifa é fundamental para o cumprimento do acordo de climatização.
“Vale lembrar que a cidade do Rio de Janeiro tem a tarifa mais baixa entre as principais capitais do país, metrópoles que já reajustaram o valor das respectivas passagens para manter a saúde econômico-financeira das empresas e o investimento em melhorias para o setor”, disse o sindicato, que usa São Paulo como exemplo: “Desde 1º de janeiro, é cobrada a tarifa já reajustada de R$ 4,40, sendo que a cidade tem apenas 31% da frota climatizada”.
Reajuste sem previsão
A Secretaria Municipal de Transportes disse à Agência Brasil não ter previsão para o reajuste das tarifas. A passagem de ônibus no Rio de Janeiro é de R$ 4,05, e o último reajuste foi em janeiro de 2019.
A primeira meta de climatizar 100% dos ônibus da cidade, estabelecida em 2012, tinha como prazo o dia 31 de dezembro de 2016. No início de 2015, um reajuste adicional de R$ 0,20 chegou a ser acrescentado à passagem com esse objetivo.
No último dia daquele ano, porém, a prefeitura do Rio tentou revisar a meta para 70% das viagens de ônibus climatizadas, o que foi rejeitado pela Justiça.
O ex-prefeito Eduardo Paes deixou a prefeitura afirmando que havia conseguido climatizar 70% das viagens realizadas com bilhete único, mas o atual prefeito Marcelo Crivella questionou os dados na época, e disse que não haviam sido atingidos nem 50%.
Em 2018, um novo acordo assinado entre as empresas de ônibus e a prefeitura estabeleceu o atual prazo para a climatização. Em texto publicado no Diário Oficial do Município em 6 de agosto de 2018, a prefeitura diz que “com o Termo de Ajuste de Conduta assinado com o Rio Ônibus, a frota de ônibus será totalmente reformada até 2020, ganhando ar-condicionado, sinal de wi-fi e entradas de USB em cada assento, para que os passageiros possam acessar a internet e carregar os telefones celulares durante as viagens”.
O sindicato de ônibus afirma, no entanto, que a obrigação prevista pelo acordo é referente apenas à climatização.
A circulação de ônibus com ar-condicionado vem sendo cobrada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), que iniciou diferentes processos contra o município e as concessionárias nos últimos anos.
Os questionamentos do MPRJ aos problemas no serviço de transportes começam antes da promessa de climatização e voltam ao edital que estruturou o atual sistema de concessões, em 2010.
Em uma Ação Civil Pública ajuizada em outubro do ano passado, o MP afirma que a concorrência pública teve inúmeras irregularidades, que resultaram no direcionamento das concessões às empresas que já dominavam o setor há décadas.
“No ponto em que estamos, não é mais possível ignorar o emaranhado de ilegalidades que envolvem a concessão dos ônibus, a começar pela própria licitação”, disse a promotoria na Ação Civil Pública.
Apesar da cobrança pela climatização, ar condicionado nem sempre é sinônimo de conforto. Morador de Campo Grande, na zona oeste do Rio, o corretor de imóveis Guilherme Souza, de 27 anos, prefere se deslocar usando as vans do transporte alternativo do que recorrer às linhas de ônibus do bairro.
Janelas abertas
O motivo é que, segundo ele, é frequente encontrar ônibus com o ar-condicionado desligado ou sem funcionar. “Quando o ônibus não tem [ar-condicionado] é até melhor, porque tem janelas [abertas]. Os que têm ar não funcionam e ficam aquela sauna abafada”, reclama ele, que afirma evitar as linhas 851, 847 e 848, que circulam no interior do bairro.
A universitária Cintia Carvalho, de 24 anos, conta que percebeu uma diferença na oferta de viagens com ar-condicionado quando se mudou de Cachambi para o centro da cidade. “Percebo um aumento nos ônibus com ar-condicionado na cidade, mas é regionalizado. Piora quanto mais para zona norte você vai”, opina ela.
Viagens de ônibus com ar-condicionado são uma raridade na rotina da publicitária Natasha Cotta, de 34 anos, que ainda relata problemas de limpeza no transporte. Moradora de Copacabana, ela costuma descer do metrô na Glória para ir para a Lapa de ônibus, mas a linha 497, conta ela, dificilmente está climatizada. “E quando está muito calor mesmo, aparecem umas baratinhas que provam que, além disso, eles não fazem a limpeza”, finaliza.