A Justiça Federal da 1ª Região negou o pedido de um grupo de 70 advogados para afastar o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Eles acusam Santa Cruz de usar o cargo para “atacar de forma pessoal e individualizada os poderes do presidente Jair Bolsonaro”. O juiz federal substituto da 3ª Vara Federal em Brasília, Bruno Anderson dos Santos Silva, arquivou o processo por considerá-lo sem fundamento.
O grupo questiona, entre outras coisas, uma ação movida pela OAB no Supremo Tribunal Federal em defesa da autonomia de estados e municípios na adoção de medidas de isolamento social contra a disseminação da covid-19. A ação já recebeu decisão do ministro Alexandre de Moraes, que acolheu e resguardou a competência dos estados para determinar medidas de isolamento.
Para o juiz, o pedido dos advogados, se atendido, poderia abrir um precedente grave para a própria advocacia. “E olhe que nem em momentos de indesejável exceção política se tentou tolher o exercício da advocacia, tendo a OAB sido criada, inclusive, na década de 30, em rápida referência”, escreveu o magistrado (veja a íntegra da decisão).
Segundo Bruno Anderson, Santa Cruz é o principal representante da entidade e, por isso, tem direito a mover ações na Justiça em nome dela.
“As tentativas de criação de precedentes dessa jaez não merecem ser alimentados, pois advoga contra o futuro da própria classe, com o perdão da nova redundância, seja individualmente, nas esferas das partes ora envolvidas, seja coletivamente, eis que enfraquece e expõe toda uma instituição e seus membros”, ressaltou o juiz em sua decisão.
De acordo com ele, questionamentos sobre a conduta ética do presidente da OAB devem ser feitos a órgãos de controle institucionais, o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, ou ao Ministério Público, se a prática também for prevista como crime, para garantir a autonomia e a independência de cada órgão. “Não é o papel do Estado-juiz tal julgamento, precipuamente, a de órgão correicional administrativo, sob a roupa de Judiciário”, alegou.
O juiz federal diz, ainda, que o instrumento utilizado pelo grupo de advogados, um mandado de segurança, não se aplica nesse tipo de caso e que o número de autores da peça é mínimo diante do tamanho da categoria em todo o Brasil.
“Em que pese a aparente legitimidade ativa para manejar a presente ação mandamental, tenho que o número de advogados que atuam, ou pretendem atuar como litisconsortes ativos, na presente ação mandamental, por si só, não se afigura relevante, haja vista que certamente faltam-lhes a representatividade da categoria para agir em nome de mais de um milhão de profissionais que elegeram seu representante.”
Os autores do pedido fazem parte do Movimento Advogados pelo Brasil, um grupo de advogados que apoia a Operação Lava Jato e tem afinidade com o presidente Jair Bolsonaro. Eles alegam que Santa Cruz age com desvio de finalidade à frente da entidade. Afirmam que o presidente transformou o Conselho Federal da OAB em uma entidade “político-partidária” e tem “reconhecido e notório viés ideológico esquerdista e comunista”.
A defesa de Santa Cruz argumenta que há “inequívoca litigância de má-fé e pretensão de projeção midiática nacional” por parte dos impetrantes. Assinam o texto em favor do presidente da OAB dez ex-ocupantes do cargo. O único ex-presidente vivo da Ordem que não assina é Marcelo Lavenére, que está internado com covid-19.
“A Ordem dos Advogados do Brasil tem estrutura política e institucional para proteger direitos e garantias da sociedade civil. A independência em relação aos órgãos estatais garante à instituição o papel de voz do cidadão em postura contramajoritária, estabelecendo o diálogo entre as instituições e a sociedade de forma apartidária, porém não apolítica”, diz trecho do documento.
O presidente Jair Bolsonaro e Felipe Santa Cruz têm tido rusgas há algum tempo. Em julho do ano passado, Bolsonaro atacou o presidente da OAB ao falar sobre seu pai, desaparecido político no período da ditadura militar. “Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade”, disse o presidente na ocasião.
Em resposta, o presidente da Ordem entrou com uma interpelação no STF para que Bolsonaro esclarecesse as declarações sobre a morte do seu pai, Fernando Augusto Santa Cruz. O caso foi arquivado.