Em réplica aos argumentos apresentados pela defesa do senador Aécio Neves (PSDB/MG), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, reiterou nesta terça-feira (27) o pedido feito ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que receba integralmente a denúncia contra o parlamentar por solicitação e obtenção, junto ao empresário Joesley Batista, de propina, no valor de R$ 2 milhões e por obstrução da Justiça, ao tentar atrapalhar o andamento da Operação Lava Jato. No documento, também são acusados a irmã do parlamentar Andréa Neves da Cunha, o primo dele Frederico Pacheco de Medeiros, e Mendherson Souza Lima, ex-assessor parlamentar do senador Zezé Perrela (MDB/MG).
Na peça, Dodge frisa que Aécio Neves empregou todos os seus esforços na tentativa de embaraçar as investigações da Lava Lato, atuando para aprovar o projeto de lei de abuso de autoridade (PLS 85/2017) e a anistia para crimes de caixa dois, no âmbito da tramitação das chamadas “10 medidas contra a corrupção”. Também exerceu pressão sobre membros do governo e da Polícia Federal, com o propósito de escolher delegados para conduzir os inquéritos.
Quanto à alegação apresentada pelo parlamentar, de que os R$ 2 milhões supostamente seriam relativos a um empréstimo lícito solicitado a Joesley Batista para a contratação de serviços advocatícios, Dodge lembra que não existe nos autos qualquer prova de que tal empréstimo de fato tenha ocorrido, como cópias do contrato.
“O caráter de vantagem indevida dos valores solicitados por Aécio Neves e por Andréa Neves a Joesley Batista fica claro quando o senador afirma que a pessoa que iria receber as parcelas deveria ser alguém ‘que a gente mata ele antes de fazer delação’”, frisou a procuradora-geral, em referência ao diálogo gravado entre Joesley e Aécio. Além disso, a forma como os valores foram entregues, em dinheiro, com utilização de artimanha para dissimular o seu recebimento, também demonstram a ilicitude da transação, acrescentou a PGR.
Troca de favores – Segundo as provas colhidas na investigação, a solicitação de vantagens ilícitas não é ato isolado no relacionamento entre Aécio e Joesley, mas um episódio de longo tempo que caracteriza crime contra a administração pública. Merece destaque o relato dos colaboradores Ricardo Saud e Joesley Batista, segundo o qual a J&F, em 2014, repassou R$ 60 milhões ao parlamentar por meio de notas frias, a diversas empresas indicadas por ele, e pagou partidos políticos para ingressarem na coligação da candidatura de Aécio à Presidência da República. Em contrapartida, o senador usou o seu mandato para beneficiar diretamente os interesses do grupo.
Esses dados, continua Dodge, são indicativos seguros de que Aécio Neves, de forma consciente, recebeu por intermédio de terceiros parcelas da vantagem indevida em episódios monitorados por ação controlada, “não por caridade ou por qualquer outra razão alegada pelas defesas, mas porque estava preparado para prestar as contrapartidas cabíveis, no momento oportuno”, ressaltou, na peça.
Validade da gravação – A procuradora-geral reafirma ainda a validade da gravação ambiental feita por Joesley, de uma conversa com Aécio Neves. Para ela, ficou claro que não houve qualquer tipo de indução por parte dos colaboradores para que o senador cometesse o crime de corrupção passiva. “Deu-se exatamente o contrário: Joesley Batista foi espontaneamente procurado, em 18 de fevereiro de 2017, por Andréa Neves da Cunha, irmã de Aécio Neves, na escola Germinare, contígua à sede do Grupo J&F, ocasião em que ela lhe solicitou, em favor do seu irmão, o pagamento de R$ 2 milhões”.
Na gravação ambiental, também não consta qualquer participação do Ministério Público Federal ou da Polícia Federal. “Ela foi feita inteira e espontaneamente pelo colaborador e, em seguida, espontaneamente entregue à PGR como elemento de corroboração das declarações por ele prestadas em sua colaboração premiada”. Os acusados, ao alegarem que a gravação feita por Joesley caracteriza ação controlada sem autorização judicial, buscam confundir conceitos de modo a conduzir à conclusão de que tal prova é nula, destaca a PGR.
Pedidos – A denúncia oferecida no Inquérito 4506 pede a condenação de Aécio Neves por corrupção passiva e obstrução da Justiça, e dos outros acusados, por corrupção passiva. A PGR também quer a condenação de Aécio Neves e Andréa Neves à reparação dos danos materiais no valor dapropina, R$ 2 milhões, devendo ser destinado à União. Também é pedida a condenação de Aécio Neves e Andréa Neves à reparação dos danos morais, decorrentes da corrupção, cujos prejuízos revelam-se difusos, no valor de R$ 4 milhões.